O
primeiro concílio ecumênico da Histórica da Igreja foi convocado pela
imperador Constantino, em Niceia, na Bitinia (hoje, Isnik, na Turquia). O
propósito principal do concílio era procurar sanar o cisma na igreja,
provocado pelo arianismo.
Isto foi feito, teológica e politicamente, por meio da produção,
quase unânime de urna confissão teológica (o Credo de Niceia), elaborada
por mais de trezentos bispos, que representavam quase todas as
províncias orientais do Império (onde a heresia estava principalmente centralizada)
e por uma representação simbólica do Ocidente. Portanto, o credo assim
produzido podia legalmente reivindicar autoridade universal, porque foi
enviado a todas as partes do Império, para receber a concordância das
igrejas (condi as conseqüências alternativas da excomunhão e do banimento
imperial).
A questão que culminou em
Niceia surgiu de uma tensão não resolvida dentro do legado teológico de
Orígenes, no tocante ao relacionamento entre o Filho e o Pai. De um lado, havia
a atribuição de divindade ao Filho num relacionamento com o Pai, descrito
como geração eterna. Do outro lado, havia um subordinacionismo evidente.
Quase de modo apropriado, a disputa irrompeu em Alexandria, em 3 l8, sendo
que Ario, um presbítero popular da região eclesiástica de Baucalis,
desenvolveu a linha de pensamento posterior do origenismo contra o
bispo Alexandre, que propunha a primeira das duas linhas de pensamento acima.
Ario era um lógico bem capacitado, que atacou Alexandre (com motivos
não exclusivamente eruditos), acusando-o de sabelianismo. Depois de um
sínodo local ouvir suas opiniões e desconsidera-las como a ele também, por
não serem sãos, Ario demonstrou seus talentos literários e políticos
popularizantes, conseguindo apoio além da área de Alexandria. Suas
opiniões agradavam os origenistas da ala esquerda, incluindo o respeitado
Eusébio, bispo de Cesareia. Seu aliado mais intimo, e que mais ajuda lhe
deu, foi seu antigo colega de estudos na escola de Luciano, Eusébio, bispo
na residência imperial em Nicomédia. Depois de o enviado pessoal de
Constantino, Hósio de Córdoba, ter fracassado na sua tentativa de
reconciliação das duas partes em Alexandria, o imperador resolveu convocar
um concílio ecumênico.
O ensino do arianismo é
bem documentado. A ideia central, controladora, é a natureza sem
igual, incomunicável, indivisível do Ser Divino único. É a ele que os
arianos chamavam de Pai. Levando à conclusão lógica esta definição do Pai, e
fazendo uso de certa linguagem bíblica. os arianos argumentavam que, para
evitar o erro de Sabélio (e todos estavam ansiosos por evita-lo), certas
conclusões a respeito do Filho eram inevitáveis. E é esse conceito do
Filho que é a relevância central do arianismo. Ele não pode pertencer ao
Ser ou à essência do Pai (do contrario, aquela essência seria divisível ou
comunicável ou, de alguma maneira, não única nem singela, o que pela sua
definição é impossível). Ele existe, portanto, somente mediante a vontade
do Pai, assim corno existem todos os demais seres e objetos criados. A
descrição bíblica que diz que ele foi gerado realmente subentende um
relacionamento especial entre o Pai e o Verbo ou Filho, mas não se pode
tratar de um relacionamento ontológico. “Gerado” deve ser entendido no
sentido de “feito”. de modo que o Filho é um Ktisma ou poiema, uma
criatura. Sendo gerado ou feito, Ele deve obrigatoriamente ter tido um
começo. e isto leva à frase ariana famosa: “Tempo houve quando Ele
não existia”. Visto que Ele não foi gerado do Ser do Pai, e visto que. conforme
concediam, Ele era o primeiro na criação de Deus, logo Ele deve ter sido
criado do nada, não sendo de substancia perfeita ou imutável. Ele
estava sujeito a mudança moral. E por causa da extrema transcendência de
Deus em ultima analise, o Filho não teria nenhuma comunhão com o Pai nem
conhecimento dele. A atribuição de Theos a Cristo, nas Escrituras, era
considerada meramente funcional.
O concílio de Niceia foi aberto em 19 de junho de 325,
tendo como presidente Hosio de Cordoba, e a presença do imperador. A despeito
da ausência de atas oficiais das reuniões. é possível reconstruir um
esboço das atividades. Depois de um discurso de abertura proferido pelo
imperador, no qual foi ressaltada a necessidade da união. Eusébio de
Nicomédia, líder do partido ariano, apresentou uma formula de fé que
marcava abertamente uma saída radical das formulações tradicionais. A
desaprovação foi tão forte que a maioria do partido ariano abandonou seu
apoio ao documento, que foi rasgado diante de todos os presente. Pouco depois,
Eusébio de Cesaréia, preocupado com sua boa reputação, leu uma
longa declaração de fé, que era, provavelmente, um credo batismal da
igreja em Cesaréia. Eusébio havia sido provisoriamente excomungado, no
inicio do ano, por um sínodo em Antioquia, ao se recusar a assinar um
credo antiariano, 0 próprio imperador o declarou ortodoxo, sugerindo,
apenas, que adotasse a palavra hornoousios.
Durante muito tempo, acreditou-se que a confissão de
Eusébio formava a base do Credo de Niceia, que foi modificada pelo
concílio. Parece claro, no entanto, que não foi isto o que ocorreu, sendo
que a estrutura e o conteúdo do Credo eram bastante diferentes daqueles da
confissão. É mais provável que um credo tenha sido introduzido sob a
orientação de Hósio, debatido (especialmente o termo homoousia) e redigido
na sua forma final, exigindo-se as assinaturas dos bispos. Todos aqueles
que estavam presentes, (inclusive Eusébio de Nicornédia) o assinaram,
excetuando-se dois que, em seguida, foram exilados.
Deve-se notar que nesse
credo não é aquele recitado nas igrejas hoje, como o nome de “Credo de
Niceia”. Embora seja semelhante em muitos aspectos, este ultimo é bem mais
longo, e faltam-lhe algumas das frases-chaves niceianas.
A teologia expressa no credo de Niceia é decisivamente
antiariana. A princípio, a unidade de Deus é afirmada. Mas declara-se que
o Filho é “verdadeiro Deus de verdadeiro Deus”. Embora confesse que o
Filho foi gerado, o credo acrescenta as palavras “do Pai” e “não feito”. E
asseverado positivamente que Ele é parte “da essência (ousia) do Pai” e
“consubstancial (homoousia) com o Pai”. Uma lista de frases arianas, incluindo
“tempo houve quando Ele não existia”, e asseverações de que o Filho é uma
criatura ou foi feito do nada são expressamente anatematizadas. Assim,
sustentou-se em Niceia uma divindade ontológica do Filho e não meramente
funcional. A única confissão a respeito do Espírito, no entanto, foi a fé
n’Ele,
Entre outras coisas realizadas em Niceia, houve um acordo
sobre a data para celebra-se a Páscoa e uma decisão sobre o Cisma
Meliciano no Egito. Ario e seus seguidores mais resolutos foram banidos,
mas somente por pouco tempo. Entre a maioria em Niceia, constava Atanásio,
na época um o jovem diácono, que em pouco tempo sucederia a Alexandre como
bispo, e que levaria a efeito um desafio minoritário contra um
arianismo ressurgente no Oriente. A ortodoxia de Niceia, no entanto,
acabou sendo reafirmada, de modo decisivo, no Concílio de Constantinopla,
em 318.
CONCÍLIO DE NICEIA II
O sétimo concílio ecumênico forneceu o clímax (mais ainda
não o fim) da controvérsia iconoclasta, ao autorizar decisivamente a
veneração de imagens de vários tipos, mas especialmente aquelas de Cristo,
de Maria, dos santos anjos e dos santos. A controvérsia havia começado
quando os imperadores Leão III (a partir de 725) e, posteriormente, seu
filho Constantino V convocaram um concílio em 754, que baixou um
definitivo iconoclasta baseado no segundo mandamento, nos primeiros pais e
na preocupação com as imagens como tentativas de circunscrever a natureza
divina.
Essas ações foram
resistida por certas figuras influentes no Oriente, incluindo Germano de
Constantinopla e João de Damasco, além dos papas romanos Gregório II,
Gregório 1II e Adriano I. Depois da morte de Constantino V, sua esposa,
Irene, inverteu suas políticas, enquanto atuava como regente em nome do
filho do casal, I Leão IV (a quem ela assassinou posteriormente). Foi ela
quem convocou o concílio que se reuniu em Niceia em 787, como a
presença de mais de trezentos bispos. Nesse concílio, os iconoclastas
foram anatematizados e adoração de imagens foi mantida, Fez-se, no
entanto, uma distinção entre a adoração definida como proskynesis, que
deveria ser prestadas as imagens ou, mais corretamente, através dos
ídolos, que eram seus prototicos, e a adoração definida como latria, que
deveria ser prestada exclusivamente a Deus. A autoridade para adoração as
imagens era, segundo se considerava, a adoração ao anjo do Senhor, no AT;
ao Cristo Encarnado, no NT; o ensino e a pratica dos pais posteriores; e a
pratica de venerar Maria e os santos, que se estabelecera tão firmemente
que nem se quer os iconoclastas se opunham a ela (opunham-se apenas a
adoração das imagens deles), apesar de um breve irrompimento do
iconoclasto, a posição desse concílio veio a ser a ortodoxia-padrão nas
Igrejas grega e romana.
A distinção entre proskynesis e latria, segundo as palavras
posteriormente usadas no Oriente, entre duria e latria – é tão delicada
que é imperceptível na pratica comum. Conforme Calvino argumentava, o uso
bíblico das palavras certamente não reconhece a distinção que Niceia
procurou estabelecer. Desse modo, a Reforma rejeitou a decisão
desse concílio estimular a idolatria.
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