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Como São Bento pode ajudar a salvar o nosso século?


Pelo final do século V, o Império Romano estava em ruínas. Enfraquecida desde dentro pela corrupção, pela opulência, pela luxúria e pelo comodismo, a cidade de Roma foi, durante boa parte do século, violentamente invadida por povos estrangeiros.

O Império foi à bancarrota, tanto moral quanto financeiramente, e, por volta do ano 500, Bento — um jovem nobre da cidade de Núrsia — decidiu que a melhor coisa que poderia fazer era subir para as montanhas e tornar-se eremita. Primeiro, ele foi a Subiaco e viveu em uma caverna, onde foi orientado por um monge mais velho. Finalmente, mudou-se para o sul, em Monte Cassino, onde estabeleceu pequenas comunidades de homens e mulheres que pudessem seguir uma vida simples e digna de trabalho, estudo e oração.

G. K. Chesterton diz que cada século é salvo pelo santo que lhe é mais contrário. A simplicidade monástica de São Bento era justamente a resposta de que a corrupção e a opulência do decadente Império Romano precisavam. Ele respondeu à luxúria com a pureza, à avareza com a simplicidade, à ignorância com a sabedoria, à decadência com a indústria e ao cinismo com a fé. Suas comunidades nas montanhas se tornaram faróis em uma época de trevas e um refúgio para as tempestades que estavam prestes a cair.

Vale a pena lembrar o exemplo de Bento hoje, quando muitos veem aproximar-se as mesmas tempestades do que parece ser a derrocada da civilização ocidental. Quando consideramos o fim que levou a Roma pagã, os paralelos são sensivelmente similares.

Também a nossa cultura está enfraquecida desde dentro por incríveis opulências, luxúria e sensualidade. Como os antigos romanos, a nossa sociedade mata os seus filhos que ainda não nasceram em um nível alarmante e também investe grandes montantes em máquinas militares para dominar o mundo. Nossos ricos "patrícios" reinam de seus templos de poder sem nenhuma preocupação com o povo, enquanto os "plebeus" comuns rangem os dentes com descontentamento cada vez maior. Também nós nos sentimos ameaçados por bárbaros desconhecidos que vêm do outro lado do mundo e também nós nos preocupamos em defender-nos das hordas que cruzam as nossas fronteiras.

Por que Bento escolheu simplesmente retirar-se? Acredito que ele o fez porque percebeu que a civilização romana não tinha salvação, ela já tinha chegado ao fim de sua vida útil. O primeiro capítulo da Epístola de São Paulo aos Romanos explica como Deus entrega as pessoas aos seus desejos pecaminosos e, por isso, as suas mentes ficam obscurecidas. Elas se tornam viciadas e cegas pelo pecado e são incapazes de pensar retamente. Bento subiu para as montanhas porque percebeu que com os romanos não havia diálogo. Não havia argumento possível porque os seus corações e mentes estavam obscurecidos. Eles tinham perdido a capacidade de raciocinar e a habilidade de escutar e amar a verdade.

Essa é cada vez mais a situação do mundo de hoje. Já há muito tempo que a nossa civilização virou as costas para a verdade, para a beleza e a para a bondade da fé cristã; que temos nos sujeitado ao comodismo, entregando-nos a grandes pecados de luxúria, crueldade e assassinato. Como sociedade, nós destruímos o matrimônio, abusamos de nossas crianças, matamo-nos uns aos outros, travamos guerras e roubamos dos mais pobres. Nossos corações e mentes estão agora obscurecidos. Atingidos pelo câncer intelectual do relativismo, não somos capazes nem de ouvir a razão nem de produzir argumentos. Fomos abandonados ao turbilhão de nossas emoções, agitados pela raiva, pelo ódio irracional e pela frustração demoníaca.

O que podemos fazer? Como católicos, nós viveremos cada vez mais a "opção beneditina". Há quem pense que terminaremos nos escondendo em nossos próprios enclaves, como sobreviventes de um holocausto nuclear, mais ou menos como uma volta às catacumbas. Eu não seria tão pessimista. Acredito que a "opção beneditina" pode ser simplesmente uma percepção de que precisamos retornar à essência da nossa fé e vivê-la em nossas já existentes comunidades paroquiais. Nossas paróquias podem tornar-se refúgios de paz, centros de cultura, educação e razão. Elas podem tornar-se lugares onde a oração, o trabalho e o estudo são valorizados.

Sem formar novas comunidades monásticas, nossas famílias e paróquias podem transformar-se em "mosteiros domésticos", onde nós viveremos com simplicidade e cultivaremos com consciência a nossa fé, refugiando-nos do dilúvio que devasta a nossa sociedade.

Para tanto, nós precisaremos reavaliar a nossa relação com a cultura que nos rodeia. Precisaremos simplificar as nossas vidas. Será que realmente precisamos de todas essas coisas materiais que nos puxam para baixo e nos atolam nas dívidas e no estresse? Será que realmente precisamos correr tão freneticamente, com tanta pressa, o tempo todo? Temos realmente que nos conformar com a sociedade agitada, vaidosa e avarenta em que vivemos? Realmente precisamos de todo esse entretenimento e distração que nos leva à destruição? Acho que não.

Contra tudo isso, a "opção beneditina" colocará o nosso foco nos votos que estão no coração da Regra de São Bento: estabilidade, obediência e conversão de vida. A estabilidade nos ajudará a desenvolver raízes profundas em nossa fé, em nossas famílias e em nossa Igreja. Encontraremos aí a nossa segurança, e não em nosso trabalho, em nosso dinheiro ou em nossas realizações. A obediência significa que procuraremos submeter-nos constantemente às Sagradas Escrituras, aos ensinamentos da Igreja, a Deus e uns aos outros. A conversão de vida significa que tudo o que fizermos e dissermos, e toda decisão que tomarmos, será determinada por nosso desejo de sermos completamente transformados na imagem de Cristo. Ou, como São Bento põe em sua regra, "Christo nihil praeponere — Nada antepor a Cristo".

As simples e humildes comunidades beneditinas se tornaram a fundação da maior civilização que o mundo já viu. Por um milênio, a Europa cristã esteve enraizada na singela intuição de São Bento de Núrsia. Se os católicos fizerem essa opção, ainda podemos forjar uma fundação forte e vigorosa para o futuro da nossa sociedade.

Pe. Paulo Ricardo

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